A maternidade é uma fase de grandes mudanças e emoções intensas na vida de uma mulher. No entanto, para algumas mães, esse período pode ser acompanhado por sentimentos de tristeza, angústia e falta de energia, caracterizando o quadro de depressão materna. Essa condição, que afeta muitas mulheres após o parto, pode ter impactos significativos no desenvolvimento infantil, prejudicando o vínculo mãe-filho, além de afetar o desenvolvimento emocional e cognitivo da criança, com consequências a longo prazo para sua saúde mental.
De acordo com estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), entre 10% e 20% das mulheres passam por essa condição durante a gravidez ou no período pós-parto. A psicóloga e professora da Universidade Tiradentes (Unit), Keziah Costa, explica que a depressão materna resulta de uma combinação de fatores genéticos, hormonais e ambientais. Mulheres com predisposição genética à depressão podem ter maior propensão a desenvolver esse quadro durante a maternidade.
“As alterações hormonais que ocorrem durante a gravidez e após o nascimento do bebê podem ser um dos principais fatores no surgimento da depressão. Além disso, fatores ambientais e sociais, como vulnerabilidade social, falta de acesso a cuidados de saúde, insegurança, violência doméstica e dificuldades financeiras, podem aumentar significativamente o estresse e o risco de uma mulher desenvolver depressão materna”, aponta a psicóloga.
Sintomas e repercussões da depressão materna
Os sintomas da depressão materna podem ser variados e muitas vezes sutis, o que pode dificultar seu reconhecimento. Os principais sinais incluem:
– Alterações no apetite: comer em excesso ou falta de apetite.
– Irritabilidade: maior impaciência do que o habitual.
– Desconforto físico: dores de cabeça ou outras queixas físicas sem explicação aparente.
– Preocupação excessiva: dificuldade em se concentrar ou relaxar.
– Dificuldade de conexão emocional com o bebê: o que pode ser interpretado como dificuldade em entender e responder às necessidades da criança.
A falta de uma conexão emocional entre mãe e filho, decorrente da depressão materna, pode ter consequências importantes para o desenvolvimento da criança. De acordo com a psicóloga, crianças expostas à depressão materna podem apresentar:
– Problemas emocionais e comportamentais: como agressividade, irritabilidade e dificuldades na socialização.
– Dificuldades de aprendizagem: problemas de concentração e memória. O desenvolvimento cognitivo e linguístico também pode ser prejudicado, pois a interação afetiva e o estímulo da mãe são essenciais para o desenvolvimento saudável da criança.
– Maior risco de desenvolver transtornos mentais na adolescência e na vida adulta: depressão, ansiedade e outros.
“O psicanalista inglês Donald Winnicott ressaltou a importância do vínculo entre mãe e bebê para o desenvolvimento saudável da criança. Segundo ele, a mãe precisa estar em um estado de ‘devoção’ ao bebê para suprir suas necessidades e apoiar seu desenvolvimento emocional. Uma mãe que sofre de depressão pode encontrar dificuldades para estabelecer essa conexão, o que pode impactar profundamente o bebê. A falta de interação emocional, afeto e resposta às necessidades do bebê pode afetar o desenvolvimento emocional, a saúde mental e a cognição da criança a longo prazo”, observa Keziah.
Tratamento e prevenção
Para minimizar os efeitos da depressão materna, a intervenção precoce é essencial. A psicóloga destaca a importância do acompanhamento psicológico durante o pré-natal e após o nascimento do bebê. “Se a depressão materna for identificada, é fundamental que a mãe tenha o apoio de um psicólogo e de um psiquiatra, pois o tratamento eficaz geralmente inclui o uso de medicamentos e psicoterapia. A psicoterapia pode ajudar a mãe a desenvolver habilidades para lidar com sua condição e melhorar a interação com o filho”, destaca.
A rede de apoio, composta por familiares e amigos, também é crucial para a recuperação. “Os familiares têm um papel importante ao apoiar a mãe com depressão, ajudando a assumir algumas responsabilidades com o bebê e proporcionando à mãe tempo para descansar e cuidar de si. Esse apoio pode aliviar a pressão sobre a mãe e acelerar sua recuperação”, afirma.
O papel dos profissionais e do SUS
Profissionais de saúde têm um papel central no manejo da depressão materna. A psicóloga enfatiza a importância de uma abordagem empática e compreensiva, evitando julgamentos e facilitando o acesso aos serviços de saúde mental. A psicoeducação, segundo ela, é uma ferramenta essencial para ajudar as mães e suas famílias a reconhecerem os sinais da depressão materna e a entenderem as opções de tratamento disponíveis.
O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece diversos recursos e redes de apoio para mães com depressão e seus filhos. As Unidades Básicas de Saúde (UBS) são a porta de entrada para o atendimento primário em saúde, incluindo consultas com médicos de família e psicólogos. Além disso, o Programa Saúde da Família (PSF) promove o cuidado integral à saúde das famílias, com equipes multidisciplinares que acompanham de perto a saúde de cada membro.
“O acesso a esses serviços ocorre por meio do cadastro na UBS mais próxima. Além disso, as clínicas-escola das universidades e faculdades, como a da UNIT, oferecem atendimento psicológico acessível à população. Essas clínicas proporcionam uma oportunidade para que as mães recebam apoio emocional e psicológico, ajudando a mitigar os efeitos da depressão materna no relacionamento com seus filhos e no desenvolvimento infantil”, recomenda.